Estamos a guardar energia para o que mais importa.
O Lamborghini Huracán Tecnica partilha vários componentes com o mais radical STO, mas foi feito para ser mais «amigo» das estradas.
“O Huracán Tecnica combina o nosso melhor conhecimento de design e engenharia para criar um Huracán que é tão furioso em pista quanto divertido nas vias públicas”, confia o diretor executivo da Lamborghini, Stephan Winkelmann, antes de resumir: “completa a linha Huracán, encaixando-se entre o EVO RWD e o STO”.
Isso significa que o STO, nascido para os circuitos, é o único Huracán acima do Tecnica quando este modelo se aproxima do seu final de produção — na verdade, haverá um último Huracán a ser revelado ainda em 2022, o Sterrato, com superior distância ao solo.
E os números de desempenho na verdade nem diferem tanto quanto isso: 3,2s de 0 a 100 km/h, mais 0,2s que o STO, mas o Tecnica tem uma velocidade máxima superior — 325 km/h vs. 310 km/h — porque o STO tem relações de caixa mais curtas.
“No circuito de 6,2 km de Nardo, o Tecnica é apenas 1,3 segundos mais lento, com os mesmos pneus de estrada, e isso mostra bem toda a rapidez de um carro que será guiado em asfaltos públicos dois terços do tempo”, sorri Victor Underberg, diretor da equipa de desenvolvimento.
O que nem é grande diferença, considerando que o STO é 40 kg mais leve, tem 35 Nm a mais de binário máximo (600 Nm vs 565 Nm), uma asa traseira maior, configurações de motor/transmissão mais agressivas e travões melhores — CCM-R no STO vs CCB no Tecnica, ou seja, em ambos são discos carbo-cerâmicos, mas com menos resistência ao stress e menos potência de travagem.
“Creio que os travões CCB são a melhor opção para a Tecnica porque os CCM-R do STO são mais duros e bruscos no momento em que o condutor pisa o pedal, tornando os primeiros mais adequados para a condução em estrada e mais fáceis de modular por um condutor (por comparação com um piloto)” esclarece Underberg.
Os números oficiais mostram que o Huracán Tecnica precisa de 31,5 m para se imobilizar a partir de uma velocidade de 100 km/h, apenas 1,5 m mais do que o STO.
E isso resume bem o propósito do Tecnica: um Huracán que ainda retém alguns genes de GT3, incrivelmente rápido, mas mais civilizado para asfaltos públicos. O conhecido motor V10 naturalmente aspirado de 640 cv usa aqui uma afinação final diferente da que tem no STO, o mesmo sucedendo com a caixa de sete velocidades de dupla embraiagem, que também partilham.
O EVO foi o primeiro Huracán a dispor de eixo traseiro direcional (RWS), mais tarde seguido pelo STO e agora pelo Tecnica. Permite girar as rodas traseiras em até 2,5º, o que pode reduzir (em velocidades até 60 km/h) ou aumentar (em velocidades mais altas) virtualmente a distância entre eixos em 22 cm, tornando o carro mais ágil ou mais estável, respectivamente.
Underberg esclarece que “a variação máxima dos graus é a mesma nos três modos de condução, mas a velocidade com que eles variam é diferente: no Corsa a rotação é mais lenta do que no Sport porque queremos que o Sport seja mais divertido e o Corsa mais eficaz (caso contrário, teríamos um impulso de guinada que obrigaria o condutor a corrigir novamente a posição do volante e isso tornaria a condução menos “limpa”). Se tivéssemos projetado o RWS para 5º ou 10º estaríamos a adicionar peso extra sem nenhum benefício.”
O responsável pelo projeto Tecnica mencionou os modos de direção, que são os mesmos do EVO, e que podem ser selecionados a partir do botão ANIMA na parte inferior do volante. Strada, Sport e Corsa para momentos intensos em pista.
Em termos de design e em comparação com o EVO RWD, há um novo para-choques dianteiro, uma traseira levemente redesenhada, ponteiras de escape em formato hexagonal e novas entradas e saídas de ar, resultando num aumento de 35% na força descendente sobre a carroçaria, enquanto o arrastamento é reduzido em 20%.
E com os retoques feitos em cada uma das extremidades da carroçaria, o Huracán Tecnica é seis centímetros mais longo do que o EVO, mas também 10 kg mais leve devido ao uso de capôs dianteiro e traseiro em fibra de carbono — em opção podem ser especificados painéis de portas em fibra de carbono e bacquets em microfibra para reduzir ainda mais a massa.
No interior vive-se um ambiente de um avião de combate, solenemente marcado por extensos acabamentos em Alcantara negra e carbono exposto, formas hexagonais, bancos desportivos com apoio lateral reforçado, ponte central que combina controlos físicos com display digital e volante de aro grosso à frente do painel de instrumentos digital de 12,3″.
Neste interior muito bem acabado e solidamente construído, apenas os parafusos expostos atrás do volante e o facto de o cinto de segurança estar fixo nos pilares centrais e não nos bancos causam surpresa.
Neste último caso, Victor Underberg explica que “se os cintos tivessem as fixações superiores nos bancos seria adicionado lastro desnecessário, pois o próprio banco teria que integrar as estruturas de dissipação de energia em caso de colisão, enquanto que desta forma elas ficam integradas na própria estrutura do carro”.
O ecrã central não está orientado para o condutor, mas a maioria das informações mais relevantes está diretamente na frente dos meus olhos no painel de instrumentos digital TFT de 12,3″ com limitadas hipóteses de configuração — cores e dimensões de alguns gráficos mudam dependendo do modo de condução, mas pouco mais — e que coloca em destaque as rotações e a velocidade.
A primeira parte do teste é realizada em estradas interiores desta zona espanhola do Levante e em pequenas áreas urbanas nas proximidades do autódromo Ricardo Tomo, em Valência.
Depois de subir a dramática e quase sensual moldura metálica vermelha, já posso premir o botão start com uma certa emoção antecipada, provavelmente próxima à que Indiana Jones experimentou quando se sentiu prestes a colocar as mãos no Santo Graal.
O som é alucinante (um regalo para os ouvidos) desde o primeiro segundo, quando o V10 explode com um rugido alto o suficiente para despertar todos os sentidos. Embora os transeuntes estejam já um pouco acostumados a ver supercarros nas proximidades do circuito, é aconselhável guiar com cuidado pelas povoações, onde o pavimento é bastante irregular e alguns buracos até aconselham que o nariz do carro seja levantado (há um botão no tabliê para isso).
É quando fica claro que, no modo Strada, os amortecedores magnéticos da suspensão (que têm uma configuração geral menos firme do que no STO) estão à altura da tarefa de salvar as nossas costas e evitar baixas médicas e o rolamento suficientemente suave para admitir que é possível guiar o Huracán Tecnica quase diariamente. As rodas traseiras direcionais também permitem estacionar e manobrar em áreas urbanas sem que sejam ações demasiado stressantes.
Já à saída de uma das vilas percebo que a dianteira do carro desce automaticamente quando são atingidos os 75 km/h e a primeira sequência de curvas confirma que há poucos movimentos transversais da carroçaria e que as passagens de caixa, em modo automático, são relativamente tranquilas e sem grande urgência.
O afastamento da zona urbana tem a vantagem de perder de vista grande parte do trânsito, proporcionando uma boa oportunidade para ativar o modo Sport.
O som do motor sobe consideravelmente os decibéis, o mapeamento do motor e da transmissão começam a mostrar do que são capazes e aumenta a tentação para usar as longas patilhas de alumínio para passar de caixa manualmente, assim como a quem se propõe segurar o touro furioso «pelos chifres».
Em Sport muitas pedras e imperfeições visíveis na estrada começam a ser notadas mas, estranhamente, a direção não parece mais pesada ou mais direta. Uma vez mais, Underberg tem a explicação: “há muito pouca variação na resposta da direção, pois queremos que o condutor tenha uma experiência consistente ao volante, da mesma forma que a travagem não muda consoante o modos de condução”.
Ok… E se eu quiser misturar e combinar para obter, por exemplo, um motor mais barulhento com uma suspensão mais suave, como é possível no modo Ego do SUV Urus? “Não, os parâmetros não podem ser ajustados individualmente porque achamos que temos o melhor equilíbrio com essas definições fixas”. Aqui não há espaço para egos.
Enquanto isso, estou de volta à pista para o primeiro de três turnos de quatro voltas cada, a tentar seguir Giacomo Barri num Huracán STO — como se não bastasse o piloto, também o carro é melhor…—, o piloto profissional que começou num ritmo moderado e aos poucos foi elevando a fasquia por ter visto pelo retrovisor que o carro perseguidor ia-se aguentando com trajetórias limpas — basicamente copiando-as, na verdade…
Foi quando me lembrei das palavras de Barri durante o briefing: “em circuitos com superfícies menos regulares às vezes é melhor ir em Sport e depois desligar o ESC. É por isso que viemos para uma pista com asfalto muito liso, porque não é permitido desligar o sistema de controlo de estabilidade”, concluiu com um sorriso discreto, mas percetível.
Mesmo assim, o primeiro turno foi feito completamente em Sport, para confirmar que o Tecnica tende a soltar um pouco a traseira em curvas mais fechadas/lentas, quando se pisa o acelerador cedo demais. Não é a maneira indicada de vencer a corrida contra o relógio — seja como for, ninguém estava a cronometrar —, mas a diversão resultante justificou a «traquinice», pois não foi exagerada. Uma sensação que Barri valida quando paramos no pit lane para trocar impressões.
Nas últimas oito voltas, é a vez do modo Corsa entrar em ação e do Huracán Tecnica elevar novamente a fasquia dinâmica, mesmo não permitindo que a traseira seja tão solta quanto em Sport.
Na parte sinuosa da pista, é impressionante a rapidez com que o Huracán consegue devorar — com um à-vontade quase insolente — as curvas mais rápidas, as curvas mais lentas e tudo o que há pelo meio, com enormes agilidade e eficácia sem sinais de subviragem mesmo a velocidades extremas, resultando numa experiência de condução intuitiva e acessível e já com uns pozinhos de pilotagem.
No final da experiência sai reforçada a ideia de que nada se compara com um V10 naturalmente aspirado em termos de som (e mesmo sem o sistema de escape Akrapovic que está montado no STO), levando a alguns receios sobre a impressão acústica que irá ser causada pelo primeiro Lamborghini híbrido, já no ano que vem.
Das rotações iniciais às quase 9000, quando o enorme conta-rotações se começa a «engasgar» para garantir o condutor passa «uma-acima», a sonoridade superlativa deixa qualquer um «em brasa», caso o design exterior e o cockpit de caça não tivesse já produzido essa efeito.
E é então que, quando se alivia a pressão sobre o pedal direito, os roncos e os estouros dos rateres são suficientes para submergir o condutor numa ilusória convicção de que a carreira de piloto de automóveis nunca esteve tão perto…
À medida que o ritmo das voltas aumenta, confirmo que, com os critérios adequados (e orientação valiosa do signor Barri), o ESC nem entra em jogo, também porque as tolerâncias das rodas para patinar/derrapar são menos apertadas nos modos Sport e Corsa.
Hora de encerrar esta montanha-russa de emoções, mas não antes de dar uma última olhada nostálgica no Huracán Tecnica estacionado no pit lane, a descansar após estes momentos inesquecíveis.
E mesmo com o conforto das palavras de Underberg a transbordar de confiança de que “a propulsão elétrica tem muito potencial a ser explorado pelos superdesportivos do futuro”, tenho a certeza que o futuro não será igual.
Vão ser carros incrivelmente rápidos no «disparo» inicial, sim, e competentes a curvar, claro. Mas, como em muitas outras coisas na vida, o “como” é muitas vezes mais importante do que o “quanto”.
E por falar em quanto, o preço do Huracán Tecnica rondará os 340 000 euros em Portugal, entre os 292 000 euros do EVO RWD e os (cerca de) 400 000 euros do STO.
Competência ambivalente (estrada/pista)
Detalhes de acabamentos (parafusos à mostra no volante)
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